segunda-feira, 21 de abril de 2014

Tiradentes, a história de um herói fabricado.

Entre 21 de abril de 1792 e 15 de novembro de 1889, por 97 anos o Alferes, Joaquim José da Silva Xavier, o famoso Tiradentes, foi considerado um criminoso lembrado pelos brasileiros como um exemplo a não ser seguido, de acordo com a construção da história patrocinada pela Monarquia! Após o movimento conspiratório liderado pelos militares das forças armadas e pela elite para a derrubada da monarquia brasileira, com a participação da população de forma "bestializada", como descrita pelo jornalista e testemunha ocular Aristides Lobo, existe aí uma necessidade da fabricação de símbolos e heróis para consolidação do novo Regime. Se analisarmos que o Brasil passava por uma transformação radical, tendo em vista a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, na qual libertava e transformava todos os escravos em cidadãos, embora não os preparasse para tal função. Logicamente o Regime Republicano não teria apoio popular, por isso o golpe foi tramado na calada da noite. Mas deixemos os atos da proclamação de lado e vamos analisar o homenageado com direito a feriado nacional. Quem foi Tiradentes? O que ele fez pelo Brasil? Por que nosso país tem que parar para refletir sobre o martírio e a morte de um cidadão do período colonial? Por que a semelhança dele com Jesus Cristo? Ou como retratou Décio Villares e os positivistas de plantão, por meio de suas litogravuras: "Jesus Cristo cívico". Morreu por uma causa, sim, mas que causa foi essa? Se torna herói porque foi o único a morrer, pelo menos o único oficialmente executado, pois Cláudio Manoel da Costa, outro Inconfidente, morreu de forma misteriosa na cadeia. Cabelos ao vento, barbas longas, ar sereno...a nação assistindo a injustiça que o Estado estava cometendo, mas ninguém questionando tal arbitrariedade. Aliás, questionar nunca foi uma das qualidades dos brasileiros. Num processo sem direito a defesa, onde a D. Maria I, que a história vai descrevê-la como a "Louca", já tinha dado o veredicto dos Inconfidentes antes do julgamento, pois o Alferes, de acordo com os autos da devassa, deveria morrer por "morte natural" através da forca, seu corpo dividido em pedaços e estes espalhados por onde blasfemou, sua casa demolida e jogado sal no terreno para que nada nunca mais se atrevesse a tal desforra contra a Coroa Portuguesa. Que República os Inconfidentes queriam? Certamente, influenciados pela Revolução Francesa de 1789, ou talvez empolgados com tal movimento, os Inconfidentes queriam um Brasil livre, mas certamente, não a República como vemos hoje. Em 1755 houve em Lisboa um terremoto de proporções gigantescas, praticamente aniquilando a cidade. O então líder do Governo Português, Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, resolve eliminar os jesuítas do território brasileiro e apertar a arrecadação de impostos por parte da Coroa perante os colonos, com a intenção de reconstrução da cidade. É instituído, a partir daí, o imposto conhecido como "derrama", que consistia na arrecadação de uma tonelada e meia de ouro por ano, contribuição esta que o Brasil tinha que recolher aos cofres portugueses. Caso não atingisse o valor, seria instituída a devassa, que significaria que os militares portugueses iriam até as propriedades recolher tudo o que fosse de valor, para compensar a diferença. A elite mineira, insatisfeita com as cobranças abusivas, resolve pensar num movimento emancipacionista, com intuito de iniciar "vida nova"- entenda-se "vida nova" como "zerar dívidas"- a partir de um novo Regime de Governo, Tiradentes se torna uma espécie de porta voz, com objetivo de trazer novos adeptos para a causa. O Inconfidente Silvério dos Reis aparece na história brasileira num contexto parecido com o Apóstolo Judas na história bíblica, com a diferença que Judas trai Jesus por trinta moedas de ouro e o Inconfidente trai o movimento pelo perdão de suas dívidas. A Inconfidência não chega a acontecer, será desestruturada antes de sua execução, todos serão presos, mas só Tiradentes será executado. A partir de 15 de novembro de 1889 o Brasil passa por uma trasnformação no sistema político, deixa de ser Monarquia Constitucional e se torna República, com direito a expulsão da família real. Com este fato, é necessário reconstruir todos os símbolos e heróis nacionais, o Alferes é lembrado como um cidadão que morre por uma causa, morre por uma nação, uma nova nação. A semelhança bíblica, faz parte da construção de uma nova história em que os idealizadores de um novo sistema político tem o objetivo de transformar o pensamento do povo para que a aceitação fosse sem turbulência, pois devemos considerar que ninguém subia o patíbulo para ser executado com cabelos e barbas longas e olhar sereno. O movimento de Inconfidência Mineira é lembrado como um dos precursores dos movimentos de Independência do Brasil, e até o é, mas o fato que após 1822 o Brasil se torna Independente e Tiradentes continua não sendo lembrado como uma herói nacional, somente a partir de 1889 com a Proclamação da República é que o Alferes ganha direito a feriado e toda pompa pensada pelos novos idealizadores para garantir um espaço no panteão dos heróis nacionais.

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